AbdonMarinho - RETRATOS DA MUDANÇA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sexta-​feira, 26 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

RETRATOS DA MUDANÇA.

RETRATOS DA MUDANÇA.

Por Abdon Marinho.

O EXTINTO senador Epitá­cio Cafeteira, ape­sar de não ser muito estu­dado, de ter ape­nas for­mação bancária e não ir muito além do ensino médio e nunca ter estu­dado mar­ket­ing, tinha o que os profis­sion­ais do ramo chamam de “feel­ing” – no sen­tido de per­cepção, intu­ição –, extraordinário.

Certa vez, pela eleição de 1994, seu fiel asses­sor Chico Branco, chegou para ele eufórico com o Jor­nal o Estado do Maran­hão na mão: — Chefe! Chefe! O jor­nal está dizendo que esta­mos crescendo nas pesquisas.

Cafeteira pegou o jor­nal, sem lê-​lo, retru­cou: — Pois é, Chico Branco, esta­mos crescendo como “rabo de cav­alo”, para baixo. Não está vendo a sacan­agem deste gráfico!?

Durante muitos anos essa “sacada” de Cafeteira sobre o cresci­mento como “rabo de cav­alo” povoou nos­sas con­ver­sas. Ainda hoje, vez por outra, quando encon­tro Chico Branco, ele remem­ora o fato: – Abdon, tu ainda lem­bras do “esporro” que Cafe­te­ria deu por conta do cresci­mento como “rabo de cav­alo”?

E rimos a valer.

Vinte qua­tro anos depois daquela eleição, vejo o gov­erno comu­nista estad­ual inve­stir pesado em tudo que possa sig­nificar uma mudança em relação ao gov­erno ante­rior, do grupo Sar­ney.

A última polêmica que vi nos meios de comu­ni­cação foi a explo­ração de um “com­boio” levando mate­r­ial de con­strução para uma ponte na Baix­ada Maran­hense, tudo muito bonito, dev­i­da­mente iden­ti­fi­cado visual­mente. Detalhe: a ponte prometida desde muito, ainda se encon­tra nas fun­dações e, pelo ritmo das obras, deve avançar e muito no próx­imo mandato.

A primeira inda­gação que me ocorre é: o Maran­hão mudou mesmo? Como é pos­sível que a con­strução de uma sim­ples ponte seja motivo de tanta explo­ração política? Que usem como “des­en­canto”, con­forme o próprio gov­er­nador alardeou, que estava “des­en­can­tando” a ben­dita ponte?

Vejam não se trata, sequer, da inau­gu­ração da obra – que ainda não saiu do lugar –, mas ape­nas do mate­r­ial. A ponte a mere­cer tanto alar­ido e explo­ração “ainda na intenção”, não é a que vai ligar a Ponta da Madeira ao Cujupe, com quase 20 km, mas, ape­nas uma “pon­tinha”, com cerca de 500 met­ros, sobre o Rio Per­icumã.

Claro que é uma obra impor­tante, assim como é a per­furação de um poço arte­siano de 80 met­ros num povoado do inte­rior – e que o gov­erno estad­ual faz questão de inau­gu­rar com dire­ito a banda de música e tudo mais.

Mas, difer­ente, do que querem mostrar, essas “miudezas”, longe de rep­re­sen­tar “avanço” ou “mudança” exibem o nosso fracasso.

Fico imag­i­nando – e só posso imag­i­nar pois não temos gov­er­nantes que pensem grande –, se fosse a obra rod­o­fer­roviária lig­ando a cap­i­tal do estado à Baix­ada Maran­hense. Nada disso! Muito longe disso!

O Maran­hão mudou! Agora se inau­gura “intenção” de fazer a obra; a assi­natura da “ordem de serviço”; o lançado da pedra fun­da­men­tal e, até o trans­porte do mate­r­ial. Uma mudança do …

Con­fesso que não con­sigo enten­der esse tipo de coisa.

Como prova de “mudança” devo dizer que a “inau­gu­ração” do trans­porte de mate­r­ial não é lá muito orig­i­nal.

Lem­bro que no gov­erno da sen­hora Roseana Sar­ney, o seu cun­hado, secretário de saúde, anun­ciou que iria resolver o prob­lema do abastec­i­mento de água na cap­i­tal. Dias depois ele fez divul­gar em todos os meios de comu­ni­cação a “inau­gu­ração de carros-​pipas”. E, lá estava ele, o próprio secretário, todo parvo “pas­sando em revista” os ditos veícu­los encar­rega­dos do trans­porte do líquido pre­cioso.

Ao ver tal cena não pude deixar de ironizar o grande “avanço” dizendo que estava muito semel­hante ao trans­porte de água do tempo de Ana Jansen, a Donana, apel­i­dada de “Rainha do Maran­hão” que por aqui viveu e fez for­tuna no século XIX. A difer­ença é que a política e empresária tocava um negó­cio a suas próprias expen­sas, sem fazer uso dos recur­sos públicos.

Doutra feita o mesmo ex-​secretário colo­cou em exibição e atra­pal­hando o trân­sito da cap­i­tal dezenas de ambulân­cias ocu­pando toda ponte do São Fran­cisco, Avenida Beira-​Mar até chegar ao Palá­cio dos Leões.

Como vemos vem de longe essa ideia de exibirem os “avanços” do nosso estado.

Há uma breve difer­ença entre uma e outra mudança: não se esteva às vésperas de uma eleição.

Quem mel­hor se aprox­i­mou do que o gov­erno estad­ual faz nos dias de hoje com a “inau­gu­ração” dos mate­ri­ais de con­strução foi o ex-​governador João Castelo quando can­didato à reeleição em 2012. Fal­tando pouco tempo para eleição inven­taram de “mod­ern­izar” o trans­porte cole­tivo para a cap­i­tal. A solução seria um VLT — Trans­porte Leve sobre Tril­hos. E, nos dias ante­ri­ores ao pleito, lá estava o tal do VLT atra­pal­hando o trân­sito da cap­i­tal. O propósito: exibir para a pat­uleia o quanto avançado seria o trans­porte da cidade com a eleição do gestor-​candidato. Não deu certo, João Castelo, iden­ti­fi­cado como rep­re­sen­tante do atraso, inclu­sive pelo que fez com o tal VLT, perdeu a reeleição para o can­didato “novo e mod­erno” apoiado pelo atual gov­er­nador que lhe copia, em seu próprio demérito, o mesmo modelo.

Ao se com­portarem assim, nada ficam devendo a ex-​governadora e sua troupe que se deixou fotogra­far sobre uma máquina no lança­mento da Refi­naria de Bacabeira, a famosa refi­naria “Viúva Porcina” – aquela que nunca existiu.

As pes­soas não percebem, e a mídia não mostra, o quanto esse tipo de coisa, longe de refle­tir “mudança”, atesta nosso desas­tre civ­i­liza­tório. Isso estar “na cara do povo”, mas ten­tam – e con­seguem –, vender aos incau­tos que estão, na ver­dade, pro­movendo uma grande mudança no Maran­hão.

Sinto a imensa falta de uma con­sciên­cia crítica, de uma sociedade que seja capaz de anal­isar os fatos como eles são de ver­dade e não como “ven­di­dos” pelos meios comu­ni­cação, estes, sem qual­quer com­pro­me­ti­mento com a ver­dade e/​ou com as mel­hores práticas.

Já encer­rando esse texto, tenho como mel­hor exem­plo de “mudança” uma peça plebisc­itária do gov­erno estad­ual. Nela, com o fundo musi­cal: “o Maran­hão está mudando, tá, tá, tá, na cara do povo…”, uma sen­hora, suposta­mente, do Municí­pio de Jeni­papo dos Vieiras, com ape­nas um dente na parte supe­rior da boca, nar­rando um pouco do seu muito sofri­mento, com a falta de assistên­cia na área da saúde pública.

A pobre sen­hora, muito feliz, elo­gia o atendi­mento que vem recebendo de um pro­grama chamado “Brigadas da Saúde” que pro­move atendi­mento nos trinta municí­pios com pior IDH.

Muito bom o com­er­cial – emo­cio­nante até –, mas que atesta o nosso atraso. Vejam uma peça pub­lic­itária que diz que o “Maran­hão está mudando” e que essa mudança “está na cara do povo”, exibe uma sen­hora com ape­nas um dente.

A pobre sen­hora, com seu solitário dente, nem descon­fia do tanto que o estado lhe é devedor.

A cara da mudança é essa da sen­hora des­den­tada? Ou essa sen­hora ape­nas atesta o fra­casso? Será que três anos e meio depois a saúde estad­ual não teve “tempo” de pro­mover uma mel­hora da den­tição desta – pelo menos –, sen­hora que aparece no com­er­cial que atesta a “mudança”? Essa é a mudança que estar cara do povo?

Nada me parece mais ilus­tra­tivo do que a mudança no Maran­hão – tão can­tada em prosa e verso –, ser rep­re­sen­tada por uma sen­hora com ape­nas um dente na parte supe­rior da boca.

Como dizia o saudoso Cafeteira sobre aquela pesquisa: – esta­mos crescendo como rabo de cav­alo: para baixo.

Abdon Mar­inho é advogado.