AbdonMarinho - A VERDADE NÃO TEM LADO.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 27 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A VER­DADE NÃO TEM LADO.

A VER­DADE NÃO TEM LADO.

Por Abdon Marinho.

PARECE incrível que uma assertiva tão sin­gela quanto à con­tida no título deste texto adquira por estas ter­ras ares tão dramáti­cos.

E isso não é de hoje, o padre Antônio Vieira, há mais de trezen­tos anos, já dizia que no Maran­hão até os céus mentem – esta citação de Vieira, registre-​se, é indi­reta e aparece no ser­mão da Quinta Dominga da Quaresma, de 1654.

Sábio Vieira que com a mais arguta vista já detec­tava o prob­lema que iria acom­pan­har a vida do maran­hense para todo o sempre.

É neste Maran­hão, 354 anos depois – em que a men­tira parece sober­ana e se ocupa da vida das pes­soas –, onde viceja a ideia de que a ver­dade tem lado. Ou, dito de outro modo, a ver­dade é aquela ver­são que os “lados” dese­jam que seja.

Um fato recente da polit­ica local reflete bem esse desmere­cer da ver­dade. Falo da dec­re­tação da ineleg­i­bil­i­dade do gov­er­nador do estado e mais três pes­soas por suposta infringên­cia a leg­is­lação eleitoral, ocor­rida na eleição munic­i­pal de Coroatá, ainda em 2016.

Esta é uma situ­ação obje­tiva. Há um decreto judi­cial afir­mando que estas pes­soas estão inelegíveis pelo prazo de 08 (oito) anos, con­ta­dos da eleição de 2016.

Pois bem, para esta situ­ação obje­tiva temos dois trata­men­tos e com­por­ta­mento dos “interessados”.

O lado dos gov­ernistas agindo e dando mostras de que nada ocor­reu, dizendo que a “sen­tença” da mag­istrada é “fake” – que nada mais é que um novo nome para velha men­tira –, desmere­cendo o tra­balho da juíza e aten­tando con­tra sua rep­utação através de diver­sos meios de comu­ni­cação.

E, para “provar” que nada disso “existe” infor­mam o reg­istro da can­di­datura da chapa gov­ernista, como prova.

Através destes e de out­ros expe­di­entes – menos repub­li­canos –, ten­tam causar embaraços a ativi­dade judi­cante da mag­istrada e dos demais mag­istra­dos que dev­erão con­hecer e se man­i­fes­tar sobre a matéria.

Já do outro lado, dos opos­i­tores, a sen­tença de primeira instân­cia foi e é “ven­dida” como defin­i­tiva, imutável, a der­radeira pá de cal na car­reira polit­ica do gov­er­nador.

Como podemos con­statar, o que temos nos com­por­ta­men­tos e noti­cias de ambos os lados é que “não existe ver­dade”, mas a ver­dade de cada um.

De den­tro de suas “bol­has” ide­ológ­i­cas e/​ou sec­tárias, remu­ner­a­dos ou não, pas­sam os dias dis­cutindo e difundindo “suas ver­dades” através dos seus veícu­los de comu­ni­cação e redes sociais.

O pior é que estas meias ver­dades – que equiv­alem a men­ti­ras inteiras –, acabam por “con­t­a­m­i­nar” quase todos e assim vemos pes­soas e veícu­los de comu­ni­cação tidos por sérios que dev­e­riam ter o com­pro­misso com a infor­mação cor­reta e esclare­cer os cidadãos sobre fatos ocor­ri­dos, “venderem” as ver­dades do “seu lado”.

No caso especí­fico, a ver­dade é cristalina.

A juíza da primeira instân­cia da justiça eleitoral tornou inelegível o gov­er­nador e mais três pes­soas por suposto abuso cometido na eleição de 2016. Ponto.

A decisão segue a ori­en­tação da jurisprudên­cia do Tri­bunal Supe­rior Eleitoral e do Tri­bunal Regional Eleitoral, as quais enten­dem que todos que con­cor­reram com a con­duta inquinada como ile­gal devem inte­grar o polo pas­sivo do processo e, con­forme seja, sofr­erem as con­se­quên­cias dos seus atos.

A ação foi pro­posta con­tra o gov­er­nador, secretários, o can­didato a prefeito e vice por esse impos­i­tivo legal.

A juíza ao jul­gar a demanda enten­deu de excluir um dos deman­da­dos, mas jul­gar proce­dente con­tra os demais, con­de­nando o gov­er­nador e o então secretário à ineleg­i­bil­i­dade e multa; e o prefeito e vice, a ineleg­i­bil­i­dade, multa e perda do mandato. Ponto.

Assim, não passa de tolice diz­erem que a juíza não pode­ria declarar a ineleg­i­bil­i­dade do gov­er­nador e do ex-​secretário. Pois é, tanto pode, que declarou.

Essa declar­ação, entre­tanto, não tem o condão de impedir o reg­istro dos can­didatos ou que façam suas cam­pan­has, como ten­taram fazer acred­i­tar, ao infor­marem que iriam reg­is­trar a can­di­datura no dia seguinte – como de fato fiz­eram –, como se dissessem: “viram? Está tudo tran­quilo, tanto que reg­is­tramos a can­di­datura e esta­mos em campanha.

Quem con­hece um pouco das coisas fica com a impressão que querem “enga­nar” os cidadãos com esse estrat­a­gema.

Isso porque nos ter­mos da Lei Com­ple­men­tar n.º 64/​1990, são inelegíveis: “d) os que ten­ham con­tra sua pes­soa rep­re­sen­tação jul­gada proce­dente pela Justiça Eleitoral, em decisão tran­si­tada em jul­gado ou pro­ferida por órgão cole­giado, em processo de apu­ração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual con­cor­rem ou ten­ham sido diplo­ma­dos, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes; (Redação dada pela Lei Com­ple­men­tar nº 135, de 2010)”.

Ora, mas qual a importân­cia deste decreto de ineleg­i­bil­i­dade? A sim­ples dec­re­tação de ineleg­i­bil­i­dade de um gov­er­nador, por si, já é impor­tante.

Ade­mais, se essa ineleg­i­bil­i­dade for jul­gada e con­fir­mada em segunda instân­cia ainda no curso do atual processo eleitoral, ou seja, antes da diplo­mação dos eleitos (caso sejam), pode levar a perda do mandato por conta do que se chama de “ineleg­i­bil­i­dade superveniente”.

Disse “pode” uma vez que depende uma ação da parte de qual­quer can­didato, par­tido politico, col­i­gação ou do Min­istério Público Eleitoral arguindo essa ineleg­i­bil­i­dade.

Assim, não faz sen­tido tratar como des­im­por­tante ou imag­i­nar que a dec­re­tação de ineleg­i­bil­i­dade não tem relevân­cia para estas eleições ou para a política maran­hense.

Primeiro, porque o processo que pode ser jul­gado pelo TRE ainda no curso deste período eleitoral, con­fir­mando a ineleg­i­bil­i­dade – aliás, não tem razão para que não seja.

Segundo, porque ainda que jul­gado fora deste período eleitoral e não possa ser sus­ci­tada a ineleg­i­bil­i­dade super­ve­niente, não havendo a rever­são da decisão, caso con­fir­mada, invi­a­bi­liza futuros pro­je­tos políti­cos do gov­er­nador que tem son­hos bem maiores.

Con­cluindo, emb­ora o revés sofrido pelo gov­er­nador e por out­ros três ali­a­dos não seja a pá de cal fes­te­jada e “ven­dida” por seus adver­sários, tão pouco, como quer fazer ele e os seus é um fato sem importân­cia que deva ser igno­rado, pelas razões que esclare­ce­mos acima.

Esta é a ver­dade e ela não tem lado.

Abdon Mar­inho é advo­gado.