AbdonMarinho - O QUE O FUTURO NOS RESERVA.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Quinta-​feira, 18 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

O QUE O FUTURO NOS RESERVA.

O QUE O FUTURO NOS RESERVA.

Em tem­pos de comu­ni­cação mod­erna, meu sobrinho me aciona pelo What­sApp. Nas men­sagens que se seguiram, entre os palavrões que foram incor­po­ra­dos ao palavreado destes dias, a revolta com o fato das pes­soas que o assaltaram e levaram seu carro outro dia, no momento em que par­ava numa far­má­cia para com­prar algo para os fil­hos recém-​nascidos, já estarem soltos. Jun­tos com os ter­mos de revolta que não ouso pub­licar, por impróprios, um vídeo com a imagem e declar­ações dos assaltantes. Em seus depoi­men­tos, impres­siona que pes­soas tão jovens, ado­les­centes, con­forme dito com dezes­seis anos, seja capazes de, sem qual­quer temor, colo­car uma arma na cabeça de um outro jovem, ape­nas um pouco mais velho, um pai de família, tomar-​lhe um veículo e talvez ceifar-​lhe a vida sem preocupar-​se com os deste jovem, esposa, fil­hos. Con­tava isso a um amigo quando ele me inter­rompeu para dizer que há menos de três meses sofreu um assalto na saída do banco. Os ladrões numa moto pen­savam que ele sacara din­heiro, colo­caram a arma na cabeça dele exi­gi­ram tudo que tinha, ante a infor­mação que nada pos­suía no momento – tinha ido ao banco deposi­tar e não sacar –, pas­sou momen­tos de angús­tia com o par­ceiro do lhe apon­tava a arma metendo “pilha” para que ele ati­rasse na vítima.

Fatos como estes estão acon­te­cendo todos os dias na nossa cidade, no nosso estado, no nosso país. A sucessão de tragé­dias mais parece um risco arran­hado, de tanto que se repete.

Nos meus anos de infân­cia e ado­les­cente con­vivi com a ideia de que os jovens eram o futuro da nação. Hoje me per­gunto qual é a ideia de futuro que temos para o país.

con­frontado com a vio­lên­cia que viti­mou meu sobrinho e meu amigo, refle­tia sobre o que vem acon­te­cendo com ö futuro do país”. Temos cri­anças já a par­tir dos dez anos empun­hando armas, já a par­tir dos doze chefiando quadrilhas. A maio­ria deles, segundo relato das víti­mas, mais cruéis e vio­len­tos que os maiores.

A vio­lên­cia é, hoje, a maior urgên­cia nacional. Não digo pelos atos desumanos que esta­mos sujeitos todos os dias, mas sim porque a ela está com­pro­m­e­tendo o próprio futurou da nação. Os efeitos disso não tar­darão a apare­cer de forma mais con­sis­tente. Hoje já se sente os reflexos em diver­sos setores, daqui a alguns daïs será deter­mi­nante para a econo­mia, a cul­tura, a educação.

Ao lado da neces­si­dade de com­bat­er­mos a impunidade que viceja numa leg­is­lação que faz o crime com­pen­sar, há tam­bém a neces­si­dade de estu­dar­mos as razões da vio­lên­cia que tomou de conta dos lares brasileiros.

A impressão que tenho é que a sociedade brasileira está aneste­si­ada de tal forma que acha nor­mal viver tran­cada den­tro seus con­domínios, com suas casas de muros ele­va­dos e toda a parafer­nália de pro­teção – que ape­nas inibe a vio­lên­cia – enquanto nas ruas, a guerra corre solta. A con­for­mação é tamanha que diante do fato de se perder os entes queri­dos quase todos os dias existe ape­nas a res­ig­nação. Como se fosse comum e nor­mal viver­mos pre­sos, como se fosse razoável nos res­ig­n­ar­mos diante da perda de cri­anças, jovens, que mal con­hece­ram a vida. Obje­ti­va­mente a sociedade se coloca em dois gru­pos um que acha que a repressão resolve e um outro que acha que deve­mos man­ter a situ­ação de impunidade, uma vez que a vio­lên­cia é fruto da desigual­dade social.

Acred­ito que as duas teses ao invés de antípo­das dev­e­riam con­ver­gir. Assim como é fun­da­men­tal ter­mos leis que punam e coíbam o crime com sev­eri­dade, pondo fim a cul­tura de que o crime com­pensa, seja pela impunidade, seja por conta das leis bran­das, é igual­mente impor­tante que toda sociedade e seus gov­er­nos esta­beleçam uma política de pro­teção e pre­venção a vio­lên­cia por e con­tra cri­anças e jovens.

Até aqui a sociedade tem per­dido seus fil­hos para crim­i­nal­i­dade. E isso começa cedo, desde a ausên­cia de plane­ja­mento famil­iar, edu­cação, assistên­cia social à leniên­cia diante dos crimes. As inter­venções do Estado, as políti­cas de pro­teção e pre­venção têm sido, até aqui, quase sem­pre nefas­tas. Como podemos explicar que cri­anças de dez, doze anos este­jam no crime? A primeira expli­cação é que não houve para elas qual­quer refer­ên­cia famil­iar, ninguém lhes ensi­nou quais­quer val­ores, nem o sagrado valor que tem a vida, tanto do seu semel­hante quanto a sua própria pois rara­mente os que enveredam pelo cam­inho do crime pas­sam dos 30 anos.

Os debates que travam sobre o assunto são na maio­ria das vezes estéreis. Há um erro de origem com as famílias abdi­cando de suas respon­s­abil­i­dades, do seu dever paterna. E esses erros vão se ampliando na falta de uma política edu­ca­cional que vá além dos estre­itos lim­ites dos con­teú­dos e tente, ao menos, pas­sar alguma noção de cidada­nia a esses infantes. Por fim uma sociedade abso­lu­ta­mente indifer­ente a seu próprio destino.

Em todos os can­tos assis­ti­mos a recla­mação geral con­tra o caos que se instalou na sociedade, con­tra os mor­ticínios indis­crim­i­na­dos, etc. Mas há que se inda­gar, alguém, exceto quando a vio­lên­cia bate a sua própria porta, se pre­ocupa com o que vem acon­te­cendo? Tomemos como exem­plo as cor­po­rações de advo­ga­dos, médi­cos, juízes, pro­mo­tores, empresários, temos visto suas pre­ocu­pações além dos seus inter­esses mais ime­di­atos? Quase nunca. A maio­ria sequer ousa recla­mar, fin­gem que não é com elas, com seus inte­grantes. Se recla­mam é como se estivessem pedindo des­cul­pas aos man­datários de plan­tão. Criou-​se a ideia – falsa – de que a crítica é uma ofensa pes­soal aos gov­er­nantes e que não podemos, os cidadãos, faz­er­mos isso. A par­tic­i­pação social que é – ao menos dev­e­ria – um dever do cidadão ganha ares de escân­dalo. Se alguém diz ou reclama de algo, vira inimigo. Ano após ano os indi­cadores apon­tam piora na edu­cação, um ou outro faz um pros­elit­ismo político aqui ou ali mas ninguém ousa chamar para si, enquanto cidadão, a respon­s­abil­i­dade para a denun­ciar as fal­has. A edu­cação vem per­dendo qual­i­dade a cada ano e ninguém parece se impor­tar com isso. Agora mesmo – e é assim quase todos os anos –, a edu­cação dos prin­ci­pais municí­pios do Maran­hão está par­al­isada. Faz mais de 60 dias que muitas esco­las estão com as por­tas bati­das, exceto pelos pro­fes­sores e alguns pais em protestos, o restante da sociedade parece descon­hecer essa situ­ação. Igno­rar que a cri­ança sem escola hoje, pode ser o mar­ginal de amanhã.

A omis­são da sociedade tem uma parcela con­sid­erável nos altos índices de vio­lên­cia que assom­bra a todos. Ninguém quer se indis­por com as autori­dades, ninguém quer dizer a verdade.

O Brasil tem com­pro­metido o seu pre­sente com essa política de covardes. Temos no mín­imo três ou qua­tro ger­ações per­di­das e se não fiz­er­mos algo com urgên­cia, as próx­i­mas ger­ações, o futuro da nação tam­bém estará com­pro­metido, restará a todos leitura do man­ual não escrito da covardia.

Abdon Mar­inho é advogado.