AbdonMarinho - A grande bobagem do debate comunista no Brasil.
Bem Vindo a Pag­ina de Abdon Mar­inho, Ideias e Opiniões, Sábado, 27 de Abril de 2024



A palavra é o instru­mento irre­sistível da con­quista da liber­dade.

A grande bobagem do debate comu­nista no Brasil.

A grande bobagem do debate comu­nista no Brasil.

Por Abdon C. Marinho*.

QUANDO li o “O nome da Rosa”, magis­tral obra do ital­iano Umberto Eco, ainda em mea­dos dos anos oitenta, fi-​lo na per­spec­tiva, tão somente, de uma obra literária, era um ado­les­cente que lia tudo e com uma enorme voraci­dade, muitas vezes pegava um livro que se “punha de pé” e lia-​o de uma só assen­tada. Foi assim com a obra em referência.

Anos depois, já no final dos anos noventa ou iní­cio dos anos dois mil, deba­tia com o amigo Wal­ter Rodrigues sobre tal obra e sobre out­ras e ele me mostrou uma outra per­spec­tiva da obra. Segundo ele, a obra era uma refer­ên­cia a diver­sas out­ras obras, cada per­son­agem tinha uma razão de ser, por exem­plo, o bib­liotecário cego seria uma hom­e­nagem ao poeta, escritor e crítico literário argentino Jorge Luis Borges, o fran­cis­cano inves­ti­gador William de Baskerville, seria uma uma hom­e­nagem a obra “O Cão dos Baskervilles”, um dos livros mais famosos de Sir Arthur Conan Doyle.

Pois bem, decor­ri­dos tan­tos anos e após a con­versa com WR, peguei o livro nova­mente para ler. Deu-​se que o livro já não era o mesmo e que eu já não tam­bém o mesmo. Éramos como dois estran­hos que se encon­travam pela primeira vez.

Essa lem­brança assaltou-​me a mente diante da “pro­fusão” de debates em torno da ideia do Brasil vir a tornar-​se um país comu­nista.

Leio, inclu­sive, que uma pesquisa suposta­mente séria informa a pat­uleia que 52% (cinquenta e dois por cento) dos brasileiros acred­i­tam nessa pos­si­bil­i­dade, sendo que destes, 72%(setenta e dois por cento) são pes­soas que votaram nos can­didatos vin­cu­la­dos à oposição.

Para com­ple­tar o fes­ti­val de bobagens que tomam de conta do país o pres­i­dente da República em dis­curso recente disse da sua enorme ale­gria ao con­seguir colo­car “pela primeira vez na história desse país” um min­istro “comu­nista” na Suprema Corte.

Foi o sufi­ciente para “incen­diar” as mentes mais férteis nos dois espec­tros políti­cos que “ninguém” con­seguem fazer descer do palanque.

De um lado, os esquerdis­tas “mio­los de pote” fes­te­jando o fato de ter­mos um min­istro “comu­nista” no STF; de outro a turma dire­itista, zan­gada e esfre­gando as mãos, e dizendo: — eu não disse? Daqui a pouco o Brasil será uma Venezuela.

Como podemos teste­munhar, a tolice parece que não escolhe lado.

O nomeado (com data para tomar assento no STF a par­tir de fevereiro de 2024) tendo saído da mag­i­s­tratura em 2006 para dis­putar mandato ele­tivo enten­deu de filiar-​se no Par­tido Comu­nista do Brasil — PCdoB, e sem­pre sus­ten­tou desde então que seria um “comu­nista, graças a Deus”. Mesmo em debates sérios, entre­vis­tas para imprensa nacional fez questão de sus­ten­tar essa con­tradição histórica de ser (ou ter sido, já que impe­dido dora­vante), um “comu­nista, graças a Deus”, indo além, por assim dizer que o comu­nismo é um “valor” cristão e tudo mais que vem no combo: Cristo seria comu­nista, que comu­nismo é viver em comunhão e tudo mais.

Todas essas bobagens primárias que de tão incon­gru­entes são como se não exis­tentes.

Sem­pre que me deparo com esse tipo de debate, de deter­mi­nadas pes­soas se dizendo que são (ou foram) comu­nistas, ainda mais quando com­ple­tam com o viés cristão, me recordo da Viúva Porcina, do clás­sico de Dias Gomes, Roque San­teiro, aquela “que era sem nunca ter sido”.

Assim, o efeito que tem ouvir deter­mi­nadas pes­soas diz­erem que são comu­nistas tem o mesmo sig­nifi­cado que teria diz­erem que são fla­men­guis­tas, vas­caí­nas ou botafoguense, etc., quando escuto respondo: — prazer, torço para o Íbis, de Per­nam­buco.

Foi com esse pen­sa­mento na cabeça, como dito, que me assaltou a lem­brança dos dois livros “O Nome da Rosa” e dos dois “eus”, pois quando estudei, ainda no primário, sobre o Comu­nismo como dout­rina política e como mod­elo econômico, o tín­hamos como mate­ri­al­ista e diabético.

O Comu­nismo tem como obje­tivo a con­strução de uma sociedade igual­itária para alcançar esse fim passa-​se por alguns “está­gios”: o fim da pro­priedade pri­vada; a cole­tiviza­ção dos meios de pro­dução; a cole­tiviza­ção da pro­dução; o fim da luta de classes; a sociedade sem classes; a extinção do Estado; e o Inter­na­cional­ismo.

Ora, para alguém se dizer comu­nista ou para ser con­sid­er­ado um comu­nista, um defen­sor de tal ide­olo­gia é necessário que defenda, viva ou lute para a imple­men­tação dos obje­tivos acima, pois essa é a essên­cia do comu­nismo como dout­rina política ide­ológ­ica.

Se não faz nada disso não é comu­nista coisa nen­huma é ape­nas tolo.

Não con­sta em lugar nen­hum que esse ou aquele político brasileiro da atu­al­i­dade defenda tais ideias.

Essa bobagem de que o comu­nismo seria uma “ver­tente” do cris­tian­ismo é ape­nas uma tolice que já foi des­men­tida inúmeras vezes pela Igreja Católica (não sei se as protes­tantes tam­bém o fiz­eram), inclu­sive pelo Santo João Paulo II.

E nem pre­cisava.

A dout­rina comu­nista se sus­tenta no mate­ri­al­ismo histórico com todos os acon­tec­i­men­tos da história sendo deter­mi­na­dos pelos fatores econômi­cos.

Ora, o mate­ri­al­ismo é o oposto da fé cristã que recon­hece a existên­cia da alma humana aberta a transcendência.

E tanto isso é ver­dade que os seus ide­al­izadores tin­ham na fé o ópio do povo a impedir a luta de classes e a supressão do Estado com todas suas con­se­quên­cias.

Essas “incom­pat­i­bil­i­dades” de se dizer comu­nista e ao mesmo tempo cristão são bem palpáveis nos países que implan­taram o comu­nismo em suas várias ver­tentes, em todos eles, em maior ou menor escala, tive­mos a repressão a fé do povo.

Poderíamos escr­ever lau­das e lau­das sobre esse assunto, porém, entendo que não faz qual­quer sen­tido, em pleno século XXI que se retorne a esse tipo de debate no Brasil.

Cog­i­tar ou defender tais ideários não tem cabi­mento nem como debate acadêmico. Não passa de tolice, como, aliás, já disse mais de uma vez.

Ao meu sen­tir o país só perde tempo com debates inócuos de ide­ol­o­gismo tolo que não nos leva lugar nen­hum. Não con­tribui com edu­cação, com a saúde, com o cresci­mento econômico, com as políti­cas públi­cas que sir­vam para mudar a vida das pes­soas.

Abdon C. Mar­inho é advogado.