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A BAR­BÁRIE, A IMPUNIDADE E O SUPREMO.

Escrito por Abdon Mar­inho

A BAR­BÁRIE, A IMPUNIDADE E O SUPREMO.

– Agora lascou.

Com estas palavras, me alcança um amigo, na madru­gada seguinte à decisão do Supremo Tri­bunal Fed­eral — STF, que deliberou, em um caso con­creto, sobre a pos­si­bil­i­dade do con­de­nado em primeira e segunda instân­cias da justiça, ini­ciar o cumpri­mento da pena, ainda que com recur­sos pen­dentes nos tri­bunais superiores.

Na tarde do mesmo dia, enquanto aguar­dava o jul­ga­mento de um processo no Tri­bunal Regional Eleitoral — TRE/​MA, foi a vez de um jovem colega indagar-​me e cobrar que opinasse sobre o tema.

A decisão da Corte Suprema talvez tenha sido o ápice uma sem­ana excep­cional­mente per­tur­badora para mim e que me faz pen­sar sobre o quê aguarda a humanidade.

Duas notí­cias vin­das do inte­rior do Maran­hão – que ainda custo em acred­i­tar – remete-​nos a um mundo de bar­bárie que pen­sava não mais exi­s­tir ou que estivesse muito longe da nossa realidade.

A primeira, de São Bernardo, municí­pio de menos de 30 mil habi­tantes, nos dando conta que “pop­u­lares» invadi­ram e seques­traram pre­sos acu­sa­dos do homicí­dio de um empresário, torturaram-​nos e os mataram. Os blogues do estado divul­garam as ima­gens do fato – que não tive cor­agem de assistir.

A segunda, vinda de Col­i­nas, cidade com pouco mais de 40 mil habi­tantes, narra que ladrões “estouraram” uma agên­cia bancária, uma refém foi vítima de “bala per­dida” ou exe­cu­tada. Quando os ban­di­dos fugi­ram do local deixando a vítima nas ime­di­ações de onde ocor­rera o delito «pop­u­lares» cor­reram para o banco para pegar e se apro­priar dos maços de din­heiro deix­a­dos pelos ban­di­dos. Mais que isso, algu­mas fontes nar­ram que fes­te­jaram a “sorte” que tiveram com a empreitada.

Os dois episó­dios nada têm, em princí­pio, com a decisão tomada pelo STF, mas rev­ela aspec­tos inter­es­santes da sociedade em que vive­mos. No caso de São Bernardo, pop­u­lares, suposta­mente, incré­du­los com a ação do Estado em punir malfeitores a ponto de tor­tu­rarem e exe­cutarem aquele(s) que come­teram um crime hediondo. Fazendo isso pub­li­ca­mente, à luz do dia, alguns exibindo o rosto às claras e sem receio.

Já no episó­dio de Col­i­nas, tais pop­u­lares não demon­straram tanto pesar pelo perec­i­mento de uma vítima inocente da ação dos facíno­ras, pelo con­trário, acharam opor­tuno tirar uma van­tagem pes­soal de uma ação odi­enta, indifer­entes ao sofri­mento da vítima e de sua família se locu­ple­taram, tam­bém eles, do roubo.

Se chegarem aos autores dos fatos de São Bernardo, estes, con­fronta­dos com a Justiça decerto que dirão que agi­ram em nome da justiça, con­tra a impunidade, etc.

Já os de Col­i­nas dirão que foram capazes de roubar o banco igno­rando a vítima por que viram “out­ros” fazendo o mesmo.

Em ambos os episó­dios a questão de fundo é a impunidade. Uns dizendo que agem con­tra a impunidade e out­ros na certeza que aquilo que fiz­eram sairá impune.

Aqui, os três episó­dios con­fluem: os bár­baros acon­tec­i­men­tos do inte­rior da Maran­hão e a decisão do Supremo. Todos têm por móvel a impunidade.

Não é atoa que os veícu­los de comu­ni­cação trataram a decisão do STF como histórica no com­bate a impunidade, colo­cando na mesma matéria tanto as decisões dos min­istros quanto os casos sím­bo­los de impunidade no país.

O caso de Pimenta Neves que tendo matado a namorada, sendo ré con­fesso, exper­i­men­tou, tar­dia­mente poucos dias na cadeia.

O caso do ex-​senador Luís Estevão que tendo sido con­de­nado pelo roubo de mil­hões de uma obra em São Paulo per­manece solto de recurso em recurso.

O caso do juiz Nico­lau dos San­tos Neto; e tan­tos out­ros casos emblemáti­cos que fazem o cidadão comum crer que a Justiça trata de forma difer­ente uns e outros.

Reputo o com­bate à impunidade uma urgên­cia nacional tão impor­tante quanto o com­bate ao mos­quito aedes aegypti, mos­quito respon­sável pelas pre­ocu­pações de quase todos os brasileiros. Aliás, a infes­tação de mos­qui­tos se deve ao fato de muitos dos respon­sáveis pelos recur­sos públi­cos estar soltos.

A decisão do STF vai além de “pre­ocu­pante» con­forme manifestou-​se, tim­i­da­mente, a Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil, ela avança sobre umas das garan­tias con­sti­tu­cionais mais caras inseri­das na Con­sti­tu­ição do país.

Está lá no artigo 5º, inciso LVII: ninguém será con­sid­er­ado cul­pado até o trân­sito em jul­gado da sen­tença penal condenatória.

Estou con­victo que a decisão, por maio­ria, do Supremo vem ao encon­tro do anseio da larga maio­ria do povo brasileiro que clama pelo fim da impunidade, sobre­tudo, daque­les que sem­pre se mostraram inat­ingíveis pela lei que dev­e­ria ser para todos e, longe, de mim, por outro lado defender a impunidade.

Ape­sar disso, entendo que há algu­mas questões que mere­cem ser respondidas:

A primeira delas é que ao Supremo não cabe ree­scr­ever a Con­sti­tu­ição. Por mais que lhe caiba fazer a inter­pre­tação da mesma, não lhe têm os min­istros, o poder de dizer que aquilo que está escrito pode ser inter­pelado de outra forma.

A segunda questão é que, emb­ora a intenção da maio­ria do Supremo seja boa, o com­bate à impunidade, como disse é uma urgên­cia, tenho dúvi­das se não estão come­tendo um mal maior.

Não há for­mas mais efi­cazes de se com­bater a impunidade? Não exis­tem mecan­is­mos que façam a Justiça fun­cionar com mais efi­ciên­cia e rapidez?

A sociedade não pode ser con­strangida à escolha de Sofia.

Em nome do fim da impunidade, abrir mão do prin­ci­pio con­sti­tu­cional da pre­sunção da inocência.

O min­istro Celso de Mello, decano do STF e um dos votos-​vencidos na matéria que dotou país de uma nova ori­en­tação, em entre­vista em rede nacional, trouxe uma questão que con­sidero gravís­sima. Ele que com­põe aquele cole­giado desde 1989 asseverou que 25% (vinte e cinco por cento), das matérias crim­i­nais que chegam aquela Corte, através de recur­sos extra­ordinários são reformadas.

O número é espan­toso. Poucos casos chegam ao Supremo, se destes 25% (vinte e cinco por cento) são refor­ma­dos, quan­tos não o são no Supe­rior Tri­bunal de Justiça — STJ, onde os recur­sos chegam com mais fre­qüên­cia e abundância?

Em vigor a nova ori­en­tação, quan­tos inocen­ta­dos pos­te­ri­or­mente, não terão amar­gado o cárcere? Quem pagará por isso? Cri­arão uma tabela dizendo quanto vale cada dia em o cidadão inocente pas­sou preso?

Claro que pre­cisamos averiguar se esse número de decisões refor­madas não é um dos sub­pro­du­tos da impunidade. Mas, ainda que seja menos, o encar­ce­ra­mento de um inocente, por um dia que seja, não pode ser tro­cada por dez, cem ou mil cul­pa­dos soltos.

A grande questão é esta: se vale a pena encar­cerar inocentes em nome do com­bate à impunidade.

Na minha opinião nada é mais impor­tante que a liber­dade de um inocente, ainda que para garan­ti­mos essa liber­dade ten­hamos que tol­erar alguns cul­pa­dos soltos.

No dia seguinte após a decisão do Supremo, ten­tando encon­trar algo de pos­i­tivo na mesma, dizia a um colega: – agora, os jul­gadores de primeira e segunda instân­cias, diante da tamanha respon­s­abil­i­dade que é man­dar um inocente para cadeia, tomarão muito mais cuidado na hora de jul­gar, verão se de fato o crime foi cometido, de forma e por quem.

Con­hece­dor de mais coisas que eu, ele me des­en­co­ra­jou: – para os inocentes, as coisas ficarão bem mais difíceis.

Será que o que nos espera é mesmo a barbarie?

Abdon Mar­inho é advogado.

A REPÚBLICA MICROCEFÁLICA.

Escrito por Abdon Mar­inho

A REPÚBLICA MICROCEFÁLICA.

QUANDO, no futuro, algum his­to­ri­ador sério se debruçar para anal­isar os dias atu­ais, con­statará que os atu­ais donos do poder não legou à pat­uleia, ape­nas mil­hares de cri­anças com a grave micro­ce­falia, situ­ação que, em maior ou menor grau, as con­dena a uma existên­cia mais sofrida e imi­tada que o restante de nós. Estes, donos do poder, nos lega tam­bém a micro­ce­falia das insti­tu­ições republicanas.

Faltam-​lhes o con­hec­i­mento e, sobre­tudo, o respeito por aquilo que o ex-​presidente José Sar­ney apeli­dou de “litur­gia do cargo”. Que, noutras palavras, sig­nifica o respeito pelas próprias insti­tu­ições. A Presidên­cia, os Min­istérios de Esta­dos, assim como o Poder Judi­ciário, o Senado da República, a Câmara dos Dep­uta­dos, o Min­istério Público e tan­tos out­ros, são insti­tu­ições da nação. Seus inte­grantes e/​ou rep­re­sen­tantes pre­cisam pos­suir um mín­imo de decoro próprio para integrá-​la e, prin­ci­pal­mente, para representá-​las.

Nos últi­mos tem­pos, mais pre­cisa­mente nes­tas últi­mas década, sobre­tudo a última – a par­tir da chegada do Par­tido do Tra­bal­hadores — PT ao poder –, os padrões éti­cos pas­saram a ser nive­la­dos numa escala menor, uma espé­cie de “fulaniza­ção» dos cos­tumes. Tudo pas­sou a ser normal.

Seria inimag­inável, noutras eras, que «per­sonas» do naipe de Renan Cal­heiro, respon­dendo a tan­tas questões judi­ci­ais, éti­cas e morais, pre­sidisse o Senado da República; ou Eduardo Cunha pre­sidisse à Câmara dos Dep­uta­dos. Na ver­dade, eles e tan­tos out­ros, sequer seriam inte­grantes de tais instituições.

Pois é, mas são mem­bros, presi­dem e são impor­tantes fig­uras da política nacional. Fiadores da governança.

Mas o que podemos esperar de país em que os pres­i­dentes da República – como os dois últi­mos – são eleitos fazendo da instân­cia maior da justiça eleitoral uma “lavan­de­ria” recur­sos escu­sos e fica tudo por isso mesmo? Será que há uma “viva alma” neste país que não saiba que as cam­pan­has do ex-​presidente Lula e da atual, sen­hora Dilma Vana Rouss­eff, foram finan­ciadas com recur­sos ori­un­dos de propinas e “lava­dos» no TSE?

As notas, tanto do par­tido quanto do insti­tuto do ex-​presidente sobre o tema, são ver­dadeiras exal­tação ao cin­ismo: “as doações foram legais e declar­adas à justiça eleitoral”.

Quanto cin­ismo. O vício é de origem, dos méto­dos usa­dos para con­seguir a doação.

Em comu­ni­cado ao TSE, respon­dendo a inda­gação daquela Corte, o juiz Sér­gio Moro afirma com todas as letras que recur­sos ori­un­dos de “propinas» finan­cia­ram aque­las cam­pan­has. Tem sen­tença ate­s­tando isso.

E o que acon­te­ceu com respon­sáveis por tais fatos: os tesoureiros ou arrecadadores? Os arti­fi­cies destas tramoias, se não estão pre­sos, estão quase todos abo­le­ta­dos nos min­istérios, são autori­dades impo­lu­tas, come­teram toda sorte de crimes e ainda são pagos pelos contribuintes.

Estran­hamente, enti­dades e cidadãos que pas­sam os dias cobrando lisura nos pleitos eleitorais nada dizem ou cobram providên­cias ou a apu­ração dos fatos pos­tos nos autos e recon­heci­dos por quase uma dezena de cidadãos que recor­reram ao insti­tuto da delação pre­mi­ada em troca de diminuição de suas penas.

O silên­cio obse­quioso rev­ela bem a “fulaniza­ção» das práti­cas, dos cos­tumes, das instituições.

Querem ver outro exem­plo claro do que falo?

O Min­istério da Justiça é o mais antigo do país. Antes da com­pan­heirada chegar ao poder o seu tit­u­lar tinha a pre­cedên­cia sobre todos os demais.

Cri­ado, antes mesmo da Inde­pendên­cia do Brasil, por decreto do príncipe regente D. Pedro, em 03 de julho de 1822. Con­sta no seu site na rede mundial de com­puta­dores que “vul­tos emi­nentes do Império e da República ocuparam-​no, na busca pelo apri­mora­mento das insti­tu­ições jurídi­cas, pro­movendo mel­ho­rias nos serviços judi­ciários e a har­mo­nia entre os poderes”.

Pois bem, será que acham nor­mal ou ético que o seu tit­u­lar atual saia para encon­tros extra-​agenda com advo­ga­dos de inves­ti­ga­dos? ou que saia por aí ante­ci­pando a inocên­cia de inves­ti­ga­dos por seus sub­or­di­na­dos, no caso da inves­ti­gação da Polí­cia Fed­eral que tem por alvo o ex-​presidente Lula? ou, ainda, que saia ate­s­tando a reg­u­lar­i­dade de con­tas de cam­panha da atual pres­i­dente, antecipando-​se a juízo do Tri­bunal Supe­rior Eleitoral? Isso, ape­nas para citar os fatos de con­hec­i­mento público. Decerto que nada disso está certo, não é ético e é moral­mente reprovável.

Como é pos­sível achar aceitável que Polí­cia Fed­eral esteja inves­ti­gando fatos tidos por crim­i­nosos e, na outra ponta o min­istro da justiça, supe­rior hierárquico da insti­tu­ição, esteja dizendo que fulano ou bel­trano é inocente e que não houve qual­quer crime nas con­tas de A ou B?

Pas­mem! Quase que diari­a­mente esta­mos nos deparando com este tipo de coisa. O min­istro, no mín­imo, corre o risco de ser des­men­tido pelos fatos. Como, aliás, já o está sendo.

A falta de noção destes que estão no poder e de seus satélites é tamanha que chegam a sug­erir a sub­sti­tu­ição do min­istro da justiça, não pelas con­du­tas inad­e­quadas demon­stradas acima, mas porque o mesmo não se mostrou capaz de inter­ferir no curso das inves­ti­gações, sobre­tudo, para elidir os crimes dos “com­pan­heiros” e crim­i­nalizar os seus adver­sários. São mesmo muito audaciosos.

Mas, meu pai, que não tinha muitas letras, cos­tu­mava dizer que cada casa era o retrato do dono. Se o dono era um porco, cer­ta­mente a casa seria um chiqueiro; se dono fosse asseado e limpo, cer­ta­mente a casa seria também.

Aí, cheg­amos ao ponto cru­cial. A ban­dalha chegou a esses níveis porque temos na chefia da nação uma pes­soa abso­lu­ta­mente inepta para o cargo. Mais, que não pos­sui a dimen­são do que seja a insti­tu­ição chamada Presidên­cia da República.

Vejam, os com­pan­heiros de seu par­tido cobravam da pres­i­dente uma defesa clara do Planalto em relação aos per­rengues que passa o ex-​presidente Lula, acos­sado por denún­cias para as quais ele, sem­pre loquaz, não pos­sui nen­huma resposta.

Até acho nor­mal que quem não sabe peça con­sel­hos a out­rem, prin­ci­pal­mente se essa pes­soal sabe alguma coisa – o que não é o caso.

A sen­hora Dilma foi além na mis­são par­tidária: mandou-​se para São Paulo, às cus­tas do con­tribuinte, para, suposta­mente, aconselhar-​se com o ante­ces­sor, cuja a con­duta é objeto de inves­ti­gação poli­cial e do Min­istério Público.

Exi­s­tiria ato maior de sub­serviên­cia? Quem foi a São Paulo ren­der hom­e­na­gens a um inves­ti­gado não foi ape­nas a sen­hora Dilma, foi a insti­tu­ição que ela rep­re­senta: a Presidên­cia da República.

Isso mesmo, a Presidên­cia da República foi ren­der hom­e­na­gens a um inves­ti­gado. A sim­bolo­gia do gesto diz muito mais que a declar­ação dela de que “o ex-​presidente Lula é objeto de grande injustiça”.

A leitura que faço do ato é que a Presidên­cia da República colocou-​se a serviço de um inves­ti­gado, como se ele (o inves­ti­gado) estivesse acima de tudo, inclu­sive da lei.

A pres­i­dente é useira e vezeira neste tipo de ati­tude: ren­der hom­e­na­gens ao ex-​presidente, de ir a São Paulo, só se con­sul­tar com ele e ates­tar sua própria inap­tidão. Agora foi além. Demon­strando não pos­suir noção de coisa alguma foi servir de escudo a um cidadão inves­ti­gado por out­ras insti­tu­ições republicanas.

Só não acred­ito que cheg­amos ao fundo do poço, porque esta turma sem­pre pos­sui uma pá à mão para cavarem um pouco mais.

Abdon Mar­inho é advogado.

VIO­LÊN­CIA ENDÊMICA.

Escrito por Abdon Mar­inho

VIOLÊN­CIA ENDÊMICA.

Em janeiro a ONG mex­i­cana Con­selho Cidadão pela Seguri­dade Social Pública e Justiça Penal divul­gou seu rank­ing de vio­lên­cia ao redor do mundo. Os números rev­e­lam aquilo que sen­ti­mos no nosso dia a dia, emb­ora não imag­inásse­mos que a situ­ação fosse tão des­fa­vorável ao Brasil.

Ape­nas para ter­mos um ideia, das cinquen­tas mais do mundo – e esse mundão que tem mais de duzen­tos países e mil­hares de cidades –, quase metade, isso mesmo, quase a metade, são brasileiras. Mais grave, a vio­lên­cia é maior nas cap­i­tais do nordeste, região mais pobre do país.

Na ordem do rank­ing temos João pes­soa (quarto); Maceió (sexto); For­t­aleza (oitavo); São Luís (décimo); Natal (décimo primeiro); Vitória (décimo quinto); Cuiabá (décimo sexto); Sal­vador (décimo sétimo); Belém (décimo oitavo); Teresina (vigésimo); Goiâ­nia (vigésimo ter­ceiro); Recife (vigésimo nono); Cap­ina Grande (trigésimo); Man­aus (trigésimo ter­ceiro); Porto Ale­gre (trigésimo sétimo); Ara­caju (trigésimo nono); Belo Hor­i­zonte (quadragésimo segundo); Curitiba (quadragésimo quarto); Macapá (quadragésimo sexto).

Com exceção de Cap­ina Grande todas as demais cidades que pon­tif­i­cam em as mais vio­len­tas são cap­i­tais dos esta­dos, onde, ao menos teori­ca­mente, os serviços públi­cos e a pre­sença do Estado dev­e­ria se fazer mais presente.

Os dados da ONG têm por base o ano de 2014. Mas, como sabe­mos, o ano de 2015 não foi muito diferente.

A vio­lên­cia alastrou-​se pelo país, e hoje, não há muita dis­tinção entre cidades grandes ou peque­nas, alcançando, inclu­sive, a zona rural dos municípios.

A ver­dade é que o Brasil perdeu a guerra con­tra a vio­lên­cia e parece não pos­sui muita aptidão para reor­ga­ni­zar as forças e ten­tar reverter a derrota.

Falta gov­erno ao país. Uma situ­ação endêmica como esta­mos vivendo na área da segu­rança era para o gov­erno cen­tral reunir-​se com os esta­dos fed­er­a­dos e encam­in­har soluções con­jun­tas, ver­i­ficar exper­iên­cias exi­tosas nos esta­dos onde a vio­lên­cia retro­cedeu e noutros países e, de forma con­junta, tentarem replicar nos esta­dos onde a situ­ação, parece haver fugido ao con­t­role (parece é um eufemismo). Outra medida de relevân­cia seria coor­denar uma política de colab­o­ração mútua entre os esta­dos e suas forças de segu­rança, prin­ci­pal­mente, na área da informação.

A impressão que passa é que o Min­istério da Justiça passa mais tempo se ocu­pando de out­ras coisas – como ates­tar idonei­dade de cer­tos ali­a­dos políti­cos, desautor­izando pro­ced­i­men­tos inves­ti­gatórios de seus sub­or­di­na­dos, com o próprio min­istro ban­cando advo­gado de defesa –, que pouco liga para uma pauta tão importante.

A vio­lên­cia flo­resce em um ambi­ente de promis­cuidade, quando o Estado, através de seus rep­re­sen­tantes, perde as condições morais de impor sua autori­dade. É o que temos visto no Brasil.

O país perde diari­a­mente a batalha con­tra a vio­lên­cia por falta políti­cas públi­cas sérias, porque os gov­er­nantes sem­pre rel­e­garam a segu­rança pública um sta­tus secundário, quando não a usando para fusti­gar adver­sários ou como instru­mento de dom­i­nação política. Nunca enten­deram que segu­rança pública é política de Estado. Tanto que sem­pre pen­saram que aos ami­gos do rei tudo era per­mi­tido, que pode­riam fazer e acon­te­cer que a Justiça jamais os alcançariam.

Esse clima de vale-​tudo, de per­mis­sivi­dade extrema, fun­ciona para os crim­i­nosos – de colar­inho branco ou bate­dores de carteiras, pas­sando por estupradores, ladrões e assas­si­nos –, como um pas­s­aporte para crime.

O Estado não se preparou e não pre­ve­niu a sociedade para um mundo em trans­for­mação, para a pro­lif­er­ação ver­tig­i­nosa das dro­gas, outro motor – ao lado da impunidade –, da violência.

Acho que um estado que retrata bem a falta de uma política de segu­rança é o Maran­hão, senão vejamos: o ano de 2002 reg­istrou, em toda a região met­ro­pol­i­tana da cap­i­tal, cerca de 200 homicí­dios, um número ele­vado, é ver­dade, mas nem se com­para aos mais de mil que ocorre todo ano, só em São Luís, foram mais de 900 mortes, colo­cando a cap­i­tal maran­hense entre as cidades as dez mais vio­len­tas do mundo, como vimos acima.

E, vejam que São Luís ainda está em van­tagem se com­para­r­mos a out­ras cap­i­tais do nordeste, como João Pes­soa, Maceió e Fortaleza.

Lem­bro nes­tas cap­i­tais nordes­ti­nas, sobre­tudo as menores, eram comum ver­mos as pes­soas sen­tadas às suas por­tas nos fins da tarde para bater papo com os viz­in­hos ou dis­cu­tir os fatos da política e do cotid­i­ano nos logradouros como praças e lar­gos. Locais estes que, ou estão aban­don­a­dos ou foram expro­pri­a­dos pelos mar­gin­ais e usuários de dro­gas, diante da omis­são do Estado.

Como explicar que uma cidade pacata, como São Luís ou mesmo a viz­inha Teresina, fig­ure entre as mais vio­len­tas do mundo? A resposta é só uma: o descaso.

No caso do Maran­hão, atém de tudo mais que fiz­eram de errado, se soma a menor per capita poli­cial do Brasil. Não temos do quê recla­mar­mos por chegar­mos onde cheg­amos. Fize­mos por onde.

Mas vamos em frente.

Emb­ora a matança seja uma boa medida para aferir a vio­lên­cia de um local, acred­ito que ela por si só não seja sufi­ciente para definir o grau de inse­gu­rança da sociedade.

Digo isso para que não nos ilu­damos com a pro­pa­ganda de que a vio­lên­cia foi reduzida porque se mata menos.

Claro que deve­mos ficar felizes a redução da matança. Mas isso não basta, prin­ci­pal­mente quando sabe­mos que houve um aumento con­sid­erável de roubo de veícu­los, assalto a ônibus, invasões de domicílios.

Não faz muito tempo, lem­bro que sabíamos de um roubo de carro, uma invasão de domi­cilio, pelos jor­nais. Hoje o crime chegou na nossa soleira, mês pas­sado foi um amigo assaltado quando chegava em casa, sendo expro­pri­ado do carro, celu­lares, din­heiro e out­ros bens; sem­ana pas­sada foi um sobrinho, antes um irmão e assim suces­si­va­mente. Fig­u­ram na lista de exceções os que ainda não foram vitima de uma modal­i­dade de crime qualquer.

Cada vez mais assis­ti­mos os cidadãos aban­donarem suas casas para viverem tran­ca­dos em aparta­men­tos, con­domínios fecha­dos. Os que resistem têm que erguer peque­nas for­t­aleza: são muros cada vez mais altos; cer­cas elétri­cas, câmeras; sen­sores, alarmes. E, ainda assim, o medo é um inimigo que se enfrenta todos os dias.

Falta gov­erno ao Brasil. Um gov­erno que chame os gov­er­nantes dos esta­dos para dis­cu­tir e imple­men­tar políti­cas con­sis­tentes, que instem a serem do oba-​oba, que encam­inhe e faça aprovar no Con­gresso Nacional uma reforma penal que cesse a impunidade; que imple­mente uma reforma no sis­tema pen­i­ten­ciário que per­mita o cumpri­mento das penas nos lim­ites da lei e que não sirva de des­culpa à impunidade.

A vio­lên­cia pode, desde que com­bat­ida com seriedade, ser não ven­cida, ao menos mino­rada. Temos o exem­plo de São Paulo que deixou de ser o estado mais vio­lento do país para se tornar um dos mais seguros. Hoje, na out­rora parada São Luís, mata-​se sete vezes mais que na cap­i­tal paulista. Claro que lá não é um paraíso na terra, mas avançaram muito no setor da segu­rança pública. Isso é inegável.

Os demais esta­dos não terão o mesmo êxito sem o apoio do poder central.

Ini­cia­ti­vas, que sabe­mos lou­váveis, não sur­tirão efeito esper­ado sem um pacto que envolva as forças da sociedade, o Poder Judi­ciário, o Min­istério Público. Faz-​se necessário, den­tro das unidades fed­er­adas um «Pacto de Estado” voltado para o com­bate à vio­lên­cia com todos os atores fazendo sua parte. O Poder Exec­u­tivo com uma polí­cia efe­tiva, com cor­rege­do­rias que com­batam abu­sos, mas que per­mi­tam o pleno exer­cí­cio da ativi­dade poli­cial, nos lim­ites da lei; um Min­istério Público que denun­cie; um Poder Judi­ciário que julgue e aplique as penas necessárias para des­en­co­ra­jar os criminosos.

Não ire­mos muito longe sem ati­tudes desta natureza.

Atém das ini­cia­ti­vas e pactos entre os poderes estad­u­ais é necessário que a União for­t­aleça suas poli­cias, fis­cal­ize as fron­teiras nacionais, evi­tando a entrada de armas e dro­gas, coor­dene a troca de exper­iên­cias e infor­mações entre os estados.

Qual­quer pes­soa com um mín­imo de bom senso sabe que só agindo em con­junto e de forma orde­nada o Brasil con­seguirá reverter a situ­ação vex­atória que o coloca – bem situ­ado –, entre os 25 países mais vio­len­tos do mundo.

Mas, ao que parece, falta aos nos­sos gov­er­nantes com­petên­cia, ini­cia­tiva e von­tade política de enfrentar este e tan­tos out­ros problemas.

Abdon Mar­inho é advogado.