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O ocaso da Justiça é o ocaso da democracia.

Escrito por Abdon Mar­inho


O ocaso da Justiça é o ocaso da democracia.

Por Abdon C. Marinho.

ALGUM DIA, acred­ito que mais cedo do que muitos imag­i­nam, ire­mos nos per­gun­tar: o que acabou primeiro, a Justiça ou a democ­ra­cia?

E, então, talvez, nos dare­mos conta que a própria civ­i­liza­ção tam­bém chegou ao fim.

A frase de François Guizot que quase se torna um aforismo jurídico – antes que alguém desista por não saber o que é aforismo esclareço tratar-​se de uma máx­ima ou sen­tença que em pou­cas palavras con­tém uma regra ou um princí­pio de alcance moral –, sen­ten­cia: “quando a política aden­tra aos recinto dos tri­bunais, a justiça se retira por alguma porta”.

O pre­sente texto é o preâm­bulo de uma abor­dagem filosó­fica para uma des­graça que assom­bra os democ­ratas e as sociedades mod­er­nas: a inter­fer­ên­cia política na justiça e/​ou a inter­fer­ên­cia da justiça na política.

Como dizia um antigo pro­fes­sor: a ordem dos fatores não altera o resul­tado final, que sem­pre será a aniquilação de ambos.

Quando se ensi­nava dire­ito e quando se apren­dia o Dire­ito, éramos apre­sen­tado que as leis dev­e­riam ser o sufi­cien­te­mente claras para que os cidadãos comuns as com­preen­dessem, soubessem o que era certo e o que era errado e con­cor­dasse com aquilo.

O “pacto social” entre Estado e cidadãos regido por um con­junto de nor­mas que, razoáveis e jus­tas, a todos sub­me­tem.

Nesse tempo, tam­bém, se apren­dia que as sociedades mod­er­nas ado­tavam como mod­elo o sis­tema de poderes inde­pen­dente e har­môni­cos entre si, nos quais o Leg­isla­tivo, o Exec­u­tivo e o Judi­ciário tin­ham cada um o seu papel a ser desem­pen­hado seguindo aquele con­junto de nor­mas razoavel­mente esta­b­ele­ci­das e aceitas pela sociedade.

De outro mestre de igual sabença colhia-​se a lição: — duvi­dem de leis com­plexas e de inter­pre­tações rebus­cadas, a bal­iza da lei é a com­preen­são do homem médio, aquilo que o cidadão comum, mesmo sem muito ou estudo nen­hum, com­preende como aceitável. A lei não pode con­ter charada ou pegad­in­has.

Ao longo dos sécu­los sem­pre que um líder ou grupo político ten­tou ou con­seguiu manip­u­lar ou dom­i­nar os demais poderes o resul­tado alcançado foi régime autoritário, ditadura, destru­ição da sociedade.

O mundo vive nova­mente sob esse espectro.

Em diver­sos países do mundo assis­ti­mos líderes ou seus par­tidos políti­cos tentarem manip­u­lar os demais poderes, sobre­tudo, o Poder Judi­ciário.

Mesmo democ­ra­cias que se rep­utavam con­sol­i­dadas enfrentam está­gios de manip­u­lação ou dom­i­nação da Justiça.

O pior é que, para muitos, isso é tido como uma prática nor­mal. Agora mesmo, nos Esta­dos Unidos, o bil­ionário Elon Musk, como já fiz­era nas eleições pres­i­den­ci­ais, ten­tou, com o seu imenso pode­rio econômico, influ­en­ciar na escolha de um juiz para a Suprema Corte de um dos esta­dos – feliz­mente, sem êxito. Dizem que gas­tou cerca de 25 mil­hões de dólares na ten­ta­tiva de influir no resul­tado final da escolha dos cidadãos pois lá os juízes são eleitos.

Nos mes­mos Esta­dos Unidos – out­rora refer­ên­cia de democ­ra­cia con­sol­i­dada –, assis­ti­mos decisões sendo desre­speitadas e mesmo o enfrenta­mento das decisões pelo poder político do gov­er­nante de plan­tão.

E, mais, juízes e procu­radores sendo coagi­dos e con­strangi­dos pelo Depar­ta­mento de Justiça e o próprio pres­i­dente falando em impeach­ment de juizes.

Os exces­sos em quer­erem con­tro­lar as decisões judi­ci­ais chegou a tal ponto que o pres­i­dente da Suprema Corte, de quem pouco se ouve falar, manifestou-​se pub­li­ca­mente para dizer que o impeach­ment não é o meio ade­quado para sub­sti­tuir os recur­sos judi­ci­ais.

Vejam, isso vem acon­te­cendo naquela que já foi con­sid­er­ada como um mod­elo de democ­ra­cia para o mundo oci­den­tal.

Esta­mos diante da política (ou polit­icagem) “arrobando” os pór­ti­cos da Justiça.

Em diver­sos out­ros países o Poder Judi­ciário – e com ele as noções de Justiça e Dire­ito que apren­demos –, vem sendo aniquilado para aten­der aos inter­esses políti­cos da força dom­i­nante. Fazem isso medi­ante a sub­sti­tu­ição de juízes (muitos, inclu­sive, sendo pre­sos ou exi­la­dos), o aumento da com­posição das cortes para acres­cen­tar os “seus” ou através de alter­ações nas leis para sub­me­ter as decisões judi­ci­ais aos inter­esses políti­cos de quem se encon­tra no poder.

Em todos esses países o que temos assis­tido é a con­sol­i­dação de ditaduras, mod­e­los de gov­er­nos autoritários onde as mino­rias soci­ais e/​ou os opos­i­tores são afas­ta­dos do poder – mesmo que ten­ham sido eleitos –, ou pre­sos sem qual­quer base legal ou crime cometido.

Aliás, o “crime” é ser oposição ao gov­erno e/​ou uma ameaçar a hege­mo­nia do seu poder.

Nas últi­mas décadas o Brasil vem avançando no seu “pro­jeto” de destru­ição da Justiça. Talvez muitos dos artí­fices de tal pro­jeto nem se dêem conta disso, seguem na linha do “todo mundo faz por que não eu?”.

Assim, esses gov­er­nantes, das mais vari­adas esferas de poder vão preenchendo os car­gos de juízes dos tri­bunais com pes­soas que, a despeito de suas capaci­dades téc­ni­cas, pos­suem uma vin­cu­lação política e/​ou pes­soal ou de par­entesco com aquele que o indi­cou.

Isso acon­tece desde sem­pre, é ver­dade, mas nunca com esse nível de vin­cu­lação. De cima a baixo em todos os tri­bunais de justiça ou de con­tas, os gov­er­nantes de plan­tão não têm con­strang­i­mento de “colo­car os seus” e até mesmo de “que­brarem lanças” por essas nomeações, e se tiverem o mesmo sangue, mel­hor, bem mel­hor.

Em tem­pos idos, ainda me recordo, ninguém ques­tion­ava uma decisão judi­cial. Mesmo que dela se dis­cor­dasse, buscava-​se os recur­sos cabíveis, tinha-​se, por certo, que aquele era o entendi­mento do jul­gador a quem se dev­e­ria respeitar.

Não pas­sava pela cabeça de ninguém que por trás da decisão se escon­diam inter­esses políti­cos e/​ou de out­ros matizes.

Hoje, mesmo decisões do Supremo Tri­bunal Fed­eral, vemos sendo esquadrin­hadas nas mesas de bares com ques­tion­a­men­tos sobre suas moti­vações.

Os min­istros do Supremo Tri­bunal Fed­eral pos­suíam tal grau de respeitabil­i­dade e de ilibada con­duta que a ninguém – do cam­ponês mais rude ao pres­i­dente da República –, pas­sava pela cabeça duvi­dar da seriedade de uma de suas decisões.

Hoje, repito, com ou sem razão, se esquadrinha decisões com a mesma inten­si­dade que se ques­tiona a arbi­tragem de uma par­tida de fute­bol.

A democ­ra­cia brasileira vai per­dendo um dos seus ativos mais caros: a cred­i­bil­i­dade das decisões judi­ci­ais.

Con­forme cos­tumo dizer: a justiça na qual ninguém con­fia não é justiça.

A “des­cred­i­bi­liza­ção” da justiça é o cam­inho mais curto para implan­tação de regimes autoritários, de ditaduras, onde todos poderes, inclu­sive, o de dis­por sobre os bens, a liber­dade e a vida das pes­soas, se con­cen­tram na mão do dita­dor e daque­les no seu entorno.

O mundo está cheio desses exem­p­los, não são ape­nas exem­p­los históri­cos, são, tam­bém, exem­p­los atu­ais, que estão acon­te­cendo enquanto escrevo esse texto.

O fenô­meno global de “desa­cred­i­tar” a Justiça – e, podemos citar como exem­plo, EUA, Rús­sia, China, Venezuela, Cuba, El Sal­vador, Nicarágua, Turquia, Hun­gria, até a França –, encon­tra no Brasil o mais fér­til dos ter­renos, basta ver os últi­mos números sobre a cred­i­bil­i­dade do Judi­ciário brasileiro.

Não faz muito tempo, em 8 de janeiro de 2023, a turba enfure­cida dis­pen­sou ao STF o mesmo trata­mento dado aos out­ros poderes: invadi­ram, van­dalizaram, destruíram, além de out­ros com­por­ta­men­tos escat­ológi­cos que ficaram reg­istra­dos. Não duvido que se tivessem encon­trado por lá algum min­istro o teriam lin­chado.

Den­tro e fora do Judi­ciário mas grav­i­tando em seu entorno, vemos pes­soas se devotando aos regimes autoritários, defend­endo ditaduras, viradas de mesa, supressão da democ­ra­cia.

Quer me pare­cer que ninguém con­segue enten­der que a Justiça é a última trincheira da democ­ra­cia e da liber­dade. Parece-​me que nem mesmo o Poder Judi­ciário tem essa com­preen­são, pois se tivesse bus­caria a auto­p­reser­vação. Não faz isso, dia após dia, ali­menta os escân­da­los com benesses e pen­duri­cal­hos injus­ti­fi­ca­dos, com decisões absur­das e com com­por­ta­men­tos incom­patíveis.

Não duvi­dem, logo, logo, estare­mos fazendo a per­gunta que fiz no iní­cio do pre­sente texto.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.

Dona Neuza, cidadã.

Escrito por Abdon Mar­inho

Dona Neuza, cidadã.

Por Abdon C. Marinho.

MINHA irmã mais velha vas­cul­hava anti­gas gave­tas em busca de uma fotografia da nossa mãe para man­dar fazer uma fotografia memo­r­ial para o seu túmulo.

Encon­trou a fotografia no seu título eleitoral.

Mandou-​me o doc­u­mento (acima).

Quan­tas histórias cabem em um retân­gulo de papel des­b­o­tado pelo tempo?

Um sim­ples doc­u­mento comum a qual­quer pes­soa e com tan­tas histórias de uma vida de lutas.

O Título Eleitoral trazia a fotografia do eleitor. A cir­cun­scrição: Maran­hão; o número de inscrição; o nome do municí­pio ou dis­trito: Gov­er­nador Archer; a zona eleitoral; o nome da eleitora e diver­sas out­ras infor­mações até fechar com a assi­natura do juiz eleitoral.

Dona Neuza, nascida em setem­bro de 1936, era órfã, filha de Her­mínio Clementino de Melo e de Cân­dida Evan­ge­lista da Silva, pouco con­viveu com os pais, sendo cri­ada (?) por seu irmão mais velho, o tio Her­mes.

Não con­heceu a infân­cia, para ado­lescên­cia nunca foi apre­sen­tada.

A vida era assim. Sofrida, dura, árida como o sertão nordes­tino.

Foi de menina a mul­her e dona de casa.

Sem ter tido a chance de ter sido filha pas­sou logo para a condição de mãe.

É a vida sem reto­ques, dura e retor­cida como as árvores da caatinga.

A cidadã, D. Neuza, casou-​se com ape­nas 13 anos (ou menos?), o esposo, meu pai, sete anos mais velho; com 14 anos já era mãe, com vinte já havia parido três filhos.

Em 1968, a data da emis­são do título, já era mãe de oito fil­hos e tido inúmeros abor­tos espon­tâ­neos. Cinco anos depois, no parto do décimo filho viria a fale­cer – antes de com­ple­tar 37 anos de idade.

A cidadã, D. Neuza, que votava na sexta secção, de Gov­er­nador Archer, era domés­tica por profis­são e tinha residên­cia no Cen­tro Novo.

Emb­ora fosse for­mal­mente anal­fa­beta – jamais con­seguiu ter qual­quer edu­cação for­mal –, no seu título assina com uma fina e linda caligrafia.

Apren­deu soz­inha – como soz­inha foi em toda sua vida.

A cidadã, D. Neuza ape­sar de sua inteligên­cia supe­rior nasceu pra ser dona de casa. As lem­branças que tenho – par­tiu quando tinha cinco anos –, é dela em máquina Singer cos­tu­rando todas as roupas da família, do esposo, da sogra, dos fil­hos, dos demais par­entes; e dela na roça, cuidando de gado, de por­cos, gal­in­has; é fazendo comida para ali­men­tar um batal­hão; lavando roupas, fazendo carvão; tomando de conta da casa e dos negó­cios.

E ainda tinha tempo para cuidar dos fil­hos. Quase sem­pre, um puxando-​lhe as saias, um no colo outro na bar­riga.

O título eleitoral com suas infor­mações lim­i­tadas traz tan­tas lem­branças e tan­tas histórias.

Quando par­tiu – não deixou só uma escad­inha de descen­dentes de zero a vinte anos –, deixou-​nos um exem­plo de vida do qual nen­hum dos seus fil­hos se afas­tou.

O seu exem­plo fez-​nos fortes e resilientes para enfrentar os desafios de uma vida de orfan­dade.

A cidadã, D. Neuza, minha mãe, foi e tem sido nosso fanal, um farol a ilu­mi­nar nosso cam­inho e não nos per­mi­tir que dele nos afaste­mos.

Abdon C. Mar­inho é advogado.

O desafio da miséria.

Escrito por Abdon Mar­inho


O desafio da miséria.

Por Abdon C. Marinho.

ASSIS­TIA a um dos noti­ciários da noite quando, em horário nobre, aparece um com­er­cial do gov­erno estad­ual à guisa de apre­sen­tar seu pro­grama de com­bate à pobreza abso­luta no estado. Segundo a peça, se não me falha a memória, já foram tiradas mil­hares de pes­soas da condição de mis­éria mas que ainda exi­s­tiriam 500 mil cidadãos vivendo tal fla­gelo.

De tudo que ouvia naque­les trinta segun­dos de com­er­cial o que mais me chamou atenção foi o depoi­mento de uma sen­hora dizendo que já teve que colo­car água no fogo ape­nas com sal para beber e assim enga­nar a fome.

Fiquei com aquela imagem na cabeça – for­jado na leitura de livros, desen­volvi o hábito de con­seguir “visu­alizar” o que leio ou escuto –, con­seguia “vê” a sen­hora aque­cendo a água, provavel­mente numa “trempe” para depois beber como se fosse uma sopa de sal.

É triste, é doloroso, é deprimente.

Emb­ora seja do inte­rior do inte­rior, não lem­bro de tomar con­hec­i­mento de tamanho estado de mis­éria. Nem mesmo nas memórias das secas extremas em que os ser­tane­jos caçavam os “gabirus” para comer, deparei-​me com histórico de “sopa de sal”.

Não faz muito muito tempo recebi um mapa sobre a taxa de pobreza dos esta­dos brasileiros. O Maran­hão apare­ceu nesse estudo como “campeão”, acima de out­ros esta­dos do Nordeste, e bem acima dos esta­dos de out­ras regiões. O único perto de rivalizar com o nosso estado, em tal estudo, foi o Estado do Acre.

Trata-​se de quadro desalen­ta­dor. Talvez deva­mos, antes de quais­quer out­ras con­sid­er­ações, bus­car saber como cheg­amos a esse estado de coisas.

O Maran­hão já foi o estado “El dourado” do Nordeste, para onde, nos momen­tos mais difí­ceis da vida no sertão nordes­tino as pes­soas se mudavam para pros­perar, criar os fil­hos e fazer for­tuna.

Não faz sen­tido nen­hum que os demais esta­dos ten­ham avançado enquanto o Maran­hão, com todas as condições favoráveis, tenha regre­dido eco­nomi­ca­mente.

Um outro estudo recente apon­tou que 54% (cinquenta e qua­tro por cento) da pop­u­lação era ben­efi­ciária do “bolsa-​familia”. Mas não é só o “bolsa-​família”, temos os seguros para pescadores, temos as aposen­ta­do­rias rurais, temos o “pé de meia”, temos, agora, os vários pro­gra­mas assis­ten­ci­ais do gov­erno estadual.

Em out­ras palavras, temos quase toda a pop­u­lação do estado depen­dendo do assis­ten­cial­ismo estatal. É dizer, se acon­te­cer a catástrofe de sus­penderem ou cortarem tais pro­gra­mas a pop­u­lação morre, o estado desa­parece. Isso em um estado que já foi um dos mais promis­sores do país.

Como disse acima, sou do inte­rior do inte­rior, e me lem­bro que as pes­soas pobres de out­rora, mesmo as que nada tin­ham, podiam cul­ti­var uma roça de onde tiravam o arroz, o fei­jão, o milho, a man­dioca, a macax­eira, o max­ixe, o quiabo, o ger­i­mum, a abób­ora, a melan­cia; tin­ham can­teiros em casa onde cul­ti­vavam, a cebola, o alho, o coen­tro, e várias out­ras coisas; tin­ham gal­in­has, patos, mar­recos, por­cos, cabras e bodes, ovel­has e até mesmo umas reses. Os pobres tin­ham, ainda o babaçu, de onde tiravam o azeite das amên­doas e uti­lizavam as cas­cas para fazer o carvão.

As pes­soas eram pobres mas não eram depen­dentes de esmo­las estatais – que a época, sequer exis­tiam.

Repito: não faz parte do meu imag­inário a lem­brança de pes­soas fazendo “sopa de sal”, como nar­rado no com­er­cial do gov­erno.

Quer me pare­cer que éramos um estado de pop­u­lação pobre e agora somos um estado de pop­u­lação mis­erável. Como dizia o ex-​governador Cafeteira, cresce­mos como rabo de cav­alo: para baixo.

Pre­cisamos nos con­cen­trar – enquanto evi­ta­mos que as pes­soas mor­ram de fome ou façam “sopa de sal” –, em enten­der como regred­i­mos tanto e como fare­mos para superar esses desafios.

O Maran­hão ainda é um estado muito rico, pos­sui ativos inques­tionáveis em diver­sos segui­men­tos, mas, parece-​me, não con­segue fazer girar a “roda do desen­volvi­mento”. Chega a ser doloroso assi­s­tir­mos, em pleno século XXI, que este­jamos, ainda, na pauta de tirar­mos mil­hões de pes­soas da indigên­cia.

Acred­ito que o primeiro passo para fazer uma mudança é saber o que foi feito de errado até hoje. Não se trata de bus­car cul­pa­dos por trans­for­mar um estado de povo pobre em um estado de povo mis­erável – cul­pa­dos todos somos –, mas bus­car as razões com o propósito de fazer algo difer­ente.

Vamos insi­s­tir no absurdo de esperar resul­tado difer­ente prat­i­cando os mes­mos erros?

Não faz muito, nas min­has andanças, dis­cu­tia soluções para a edu­cação brasileira. Dizia: — olha para mel­ho­rar os níveis da edu­cação de nos­sas cri­anças e ado­les­centes pre­cisamos tornar a edu­cação inte­gral e bilíngue. Essa é a solução para ele­var os níveis edu­ca­cionais e para colo­car­mos mais recur­sos na rede vez que cada cri­ança em tempo inte­gral ou em ativi­dade com­ple­men­tar equiv­a­lente, o municí­pio recebe o dobro em recur­sos se com­parado à jor­nada nor­mal; um aluno do EJAI ou EJAI/​Profissional ren­dem cerca de 5 mil; cri­anças em crèche pública tam­bém traz receitas para os municí­pios e esta­dos.

Para minha sur­presa alguém me atal­hou para dizer: — ah, doutor, temos muita difi­cul­dades para preencher vagas no ensino inte­gral, os pais não querem. Querem ape­nas que estu­dem um turno para no outro ajudá-​los em suas ativi­dades.

Já era objeto de pre­ocu­pação minha, a dis­crepân­cia entre o número de alunos matric­u­la­dos no ensino fun­da­men­tal menor e os número de alunos do fun­da­men­tal maior e entre esse e o número de matric­u­la­dos no ensino médio. Qual­quer um que exam­ine os números percebe a existên­cia de um sen­sível decréscimo. A medida que a idade avança a fre­quên­cia na escola diminui.

Agora nos deparamos com a falta de inter­esse de muitos pais em pro­por­cionar ou lutar por uma edu­cação pública de qual­i­dade para os fil­hos, preferindo que estu­dem menos ou não estu­dem para tê-​los em out­ras ativi­dades.

Vejam que isso é andar no con­tramão da história. Na minha infân­cia os pais, mesmo os mais pobres, se esforçavam para man­dar seus fil­hos para sede dos municí­pios onde podiam ter uma edu­cação mel­hor. Muitos sofriam para alu­gar uma casa ou os man­davam para “casas de ami­gos ou par­entes” para que tivessem mel­hores chances de estu­dar.

As próprias cri­anças e/​ou ado­les­centes, mesmo pas­sando por difi­cul­dades, tin­ham inter­esse em estu­dar, aliás, tin­ham na edu­cação a única forma de ascen­são social.

Nos dias atu­ais não assis­ti­mos mais nada disso. Há uma total inver­são de val­ores que os gov­er­nantes por razões diver­sas, não con­seguem com­preen­der ou romper.

Tenho por certo que para vencer­mos o desafio da mis­éria e de atraso pre­cisamos de edu­cação.

Abdon C. Mar­inho é advo­gado.